Depois de passar um dia interinho a relaxar no Eco Resort Vila Galé, em Angra dos Reis, era hora do agito … é que eu apesar de gostar de estar quieta sem nada fazer, não o consigo por muito tempo. Queria conhecer Angra dos Reis!
E era o momento para ir conhecer a famosa Ilha Grande!
Eu não estava com grandes expectativas. Primeiro porque depois de ter conhecido o paraíso em Boipeba, lá na Bahia, seria difícil surpreender-me com uma ilha por demais conhecida e visitada! E depois porque Angra dos Reis não me estava a encher as medidas. Passo a explicar.
Estava no Rio, cidade que eu amo de paixão, meti-me num carro, onde viajei três horas e meia, para vir descansar para um resort turístico, no meio de centenas de veraneantes, distante de tudo, com algumas atividades para fazer, caríssimas, e tudo isto mais não era que a estância balnear dos cariocas, uns mega milionários com direito a ilha privada e heliporto e, depois, todos os outros com um espaço modesto para chamar de sua casa de férias … não sei, não. Não me convencia.
Mas, como em tudo na vida, de certo haveria uma razão … eu só ainda não sabia qual!
Apanhei o taxi do hotel para a cidade, que fica a dez quilómetros, e paguei 60 reais, a seguir cheguei à estação de ônibus, onde comprei o bilhete ida e volta de barco para a Ilha Grande.
Depois, ainda de táxi, acreditem, tudo fica longe, paguei extra 20 reais. Segui para o cais de embarque onde apanharia o flexboat para descer no cais da Vila do Abraão, a vila mais importante da Ilha. Até aqui, ok, nada fora do usual.
A viagem durou cerca de trinta minutos num barco Acquaflex que são embarcações rápidas e seguras, pois as bóias insufláveis à sua volta não permitem que se afundem além de funcionarem também como salva-vidas. O pior é que não se vê nada. Nada de mar, nada de mata atlântica. Bem, se espreitarmos em pé vê-se uma nesga de qualquer coisa, mas logo mandam sentar, por segurança.
No barco, a lotação estava no limite e havia gente de todo o lado … o grupo de amigos que ia passar o feriado da Páscoa juntos, o casal de nórdicos que visitava os trópicos, os mochileiros surfistas, os moradores locais que foram ao médico e os comerciantes carregados com a mercadoria e os produtos frescos que na ilha não têm.
Chegada à Ilha Grande, um cais singelo, de madeira, aguardava os turistas, trabalhadores e moradores para, logo ali na praia, entrar na pitoresca vila. Quem os aguardava também eram os carregadores de bagagem com os seus carrinhos de mão, pois na ilha não circulam carros que possam transportar os pesos, mas nada que se comparasse ao improviso que encontrei em Boipeba, meses antes …
Na beira mar estavam dezenas de restaurantes e bares que apelavam aos recém chegados. Não achei graça nenhuma … parecia uma instância balnear daquelas apinhadas de turistas de boné, sandálias, mala a tiracolo e máquina fotográfica em punho. Uma furada!
Mas … ainda assim àquela natureza deslumbrante ninguém, nem eu, punha defeito. Decidi então sentar-me à beira mar a beber uma caipirinha, a ver se animava os ânimos, e a comer um frango à periquita, opção garantida em qualquer boteco do Rio de Janeiro … precisava de perspectivar!
Distraída entre um gole e outro, reparei numa delicada rapariga, europeia de certo, que escrevia sem parar num caderno de folhas, grande, grande demais, e levantava os olhos escondidos atrás dos óculos de sol bebericando de uma garrafa de água, que abria sem vontade e apenas para se ocupar. Senti uma curiosidade enorme sobre ela. Que bonita era!
Queria saber o seu nome, porque ali estava, sobre o que escrevia. Sorri-lhe. E ela sorriu-me de volta.
Decidida, convidei-a para se juntar a mim e partilhar a vista e o franganito. Ela aceitou na hora e mudou-se para a minha mesa.
Era canadiana, vivia em Berlim e era cineasta. Eu era portuguesa, vivia no Porto e era blogger.
E a razão das coincidências da vida começam a juntar-se quais ímans poderosos e as histórias a fluírem ao encontro das vivências, quase sempre idênticas ou com resultados semelhantes.
Disse-lhe que ia dar uma volta de barco pela ilha até à famosa e premiada praia Mendes Lopes, se queria vir?
Alugamos um taxiboat a um rapaz que aguardava na postura no mar a sua vez de trabalhar … negociamos o melhor preço e disse nos que mais quatro brasileiras viriam connosco. Óptimo!
Quando as vimos chegar nem queríamos crer … quais sereias dignas de festa aquática, vinham em biquinis coloridos e reduzidos, em corpos cheios de confiança, sem medidas certas, com atitude de quem sabe o que quer!
E embarcamos.
A empatia estava instalada. Olhamos-nos de frente sem avaliações. Cada uma tão diferente da outra. E tão iguais. Apresentamos-nos …
Sou a Helena, do Porto
E eu sou a J, de Lisboa
E eu a Carla, de Montreal, mas vivo em Berlim
A sério? Eu vivo no Canadá, sou a A
Eu sou M e sou …
Carioca!!!! – gritámos em conjunto, tal era a excitação
Eu sou a G
E eu sou a J
E seguimos pelo mar dentro, salpicadas pelas gotas salgadas que temperavam a bom gosto aquele encontro improvável que tanto nos deu. É que onde quer que esteja, quem quer que conheça, o que quer que saiba faz-me ter a certeza que a base do Ser Humano é sincera, é justa e é essencialmente boa.
Por isso me entrego inteira à amizade, mesmo que de um par de horas se trate, pois como lema tenho para mim as palavras de Saint Exupéry
“Aqueles que passam por nós, não vão sós, não nos deixam sós. Deixam um pouco de si, levam um pouco de nós.”
O passeio que me deu a conhecer a segunda praia mais bonita do Brasil (isto de listar a natureza – e eu que adoro listas para minha organização mental – não é comigo!) mas, justiça lhe seja feita, é considerada um paraíso para a malta do surf porque além da areia fina e dourada, tem águas que são verdes e azuladas completamente cristalinas.
Existem duas formas de lá chegar, seguindo a trilha ou de barco.
Nós chegamos de barco, atracamos em Pouso e caminhamos cerca de vinte minutos por uma trilha que subia e descia até à praia que, sem ser deserta, não tem grande movimentação.
Mas para quem goste de andar, pode seguir desde a Vila de Abraão até Palmas, depois segue de Palmas até Mangues e em seguida de Mangues a Pouso, aí a trilha continua até chegar a Lopes Mendes.
Penso que quem chegar por mar à praia tenha outro encanto com a intocada mata atlântica que a rodeia e fique deslumbrado. Ir de barco até lá será a melhor opção!
Neste dia, o céu não nos brindou com um sol resplandecente e as nuvens teimavam a aparecer, acinzentando o céu e o semblante do horizonte … mas, meus caros, não se enganem com as aparências … a verdade e a pureza dos dias, tal como das pessoas, tem muitas cores e variadas formas, que no entanto, ainda assim, não ofuscam o privilegio de se viverem em pleno com todos os que se cruzam no nosso caminho!
mh
*As duas últimas fotografias pertencem aos sites da Globo e Catraca Livre pois transmitem um pouco da realidade da Praia de Lopes Mendes.
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