“Quando se muda de vida ao 40’s”

PARQUE LAGE RIO DE JANEIRO

Eu não sou de copy paste mas há leituras que me põe como agora, a chorar que nem uma desalmada, e não, não é de tristeza, nem sequer de alegria, é um choro de empatia. Identifico-me, sabem? É como se fosse eu que tivesse escrito aquilo que estou a ler.

Mas não fui.

Hoje de manhã ao abrir o Facebook (como sempre faço!) vi uma partilha de uma amiga que me chamou a atenção, abri mas não li … sorvi o chá que me escaldou a língua, sai de casa em cima da hora para levar os miúdos ao colégio, com o cão sempre por companhia, no regresso passei no sitio do costume para mais duas sacas de compras, chovia e por isso não passeei o Dão, estacionei à porta de casa, meti as sacas na porta do prédio e o meu fiel escudeiro, que mesmo triste abanava a cauda, subi, arrumei no frigorifico os iogurtes, compais, tomates cherries e os hamburgueres biológicos, lembrei-me do chá, agora frio, e do Facebook. Ainda lá estava, página aberta a aguardar algum tempo livre para leitura. Sentei-me, vi que outra amiga já me tinha identificado num comentário, pensei deve ser coisa séria e comecei a ler …

Quando se muda de vida aos 40

Quando se muda de vida aos 40, a coisa pia mais fino. Os outros tentam achar piada. Mas não acham. Tentam compreender. Mas nem sempre conseguem. Dizem, boa sorte, mas olha que tens uma filha. Olha que já tens 40. Tens a certeza que é mesmo isso que queres? Não, claro que não temos. Estamos à rasca, cheiinhos de medo.

Quando se muda de vida aos vinte, os outros acham imensa piada. Vão beber uns copos connosco, boa sorte, pá. Até porque, quando se muda de vida aos vinte a coisa normalmente passa por uma viagem, por uma temporada no estrangeiro. E isso toda gente sabe que isso tem uma patine brutal. Boa sorte, pá, dizem-nos, e nós achamos que vai correr tudo bem. Que vai ser a experiência de uma vida. E é. Mesmo que corra mal.

Mas quando se muda de vida aos quarenta, a coisa pia mais fino. Os outros tentam achar piada. Mas não acham. Tentam compreender. Mas nem sempre conseguem. Dizem, boa sorte, pá, mas vê lá. Olha que tens uma filha. Olha que já tens quarenta. Tens a certeza que é mesmo isso que queres? Não, claro que não temos. Estamos à rasca, cheiinhos de medo. Dificilmente nos convidam para ir beber um copo. Afinal a conversa é séria e convém estarmos sóbrios. Convidam-nos para um café. Ou, se estiverem realmente preocupados, para um almoço. Vê lá, pá. Vê lá o que vais fazer da tua vida.

Quando se muda de vida aos quarenta, a viagem é cá dentro. Não, não é dentro de Portugal. É mesmo dentro de nós. Vamos até ao tutano. À massa de que somos feitos. E dói como o raio. Se dói. Choramos imenso, rimos imenso. Parecemos uns tontos, uns putos com pés de galinha e cabelos brancos. Descobrimos que somos mais rijos do que pensávamos. Que somos mais tolerantes, mais abertos, mais flexíveis. Mas a maior descoberta não é a de que somos mais coisa nenhuma. É a de que somos apenas isto. E ser apenas isto é uma coisa que se chama vida.

Mas quando se muda aos quarenta, é um caminho de não retorno. É um bilhete só de ida. Não podemos voltar a casa, porque a casa onde morávamos afinal era uma coisa postiça. E até encontrar uma com as assoalhadas certas, onde caiba esta nossa nova vida, andamos por aí, ao relento. A viver por debaixo das pontes que vamos ter de passar.

Depois, um dia, os amigos, que continuaram preocupados connosco, voltam a convidar-nos para almoçar. E é estranho. Porque nós, os que mudámos aos quarenta, voltámos diferentes, tão diferentes que já nem falamos das mesmas coisas, usamos outras palavras, rimos com coisas que nunca tínhamos rido antes. Os amigos, têm de conhecer uma pessoa nova, mas com o mesmo nome e a mesma cara. Os amigos acham que parecemos uns miúdos, mas nós sentimos que, por dentro, passámos a ter alma de oitenta anos. Dizem-nos, estás diferente, pá. E nós olhamos para eles, e respondemos com alívio, não, pá, sabes? Agora, finalmente, é que estou igual.”

Texto de Cristina Nobre Soares

Quando acabei de ler chorava, lágrimas cheias, daquelas que molham tudo à nossa volta. Também eu agora é que estou igual ao que sempre fui. Diferente fui-me tornando cada vez que fugia de mim, cada vez que adiava, cada vez que calava. Agora, também eu me sinto tonta, atordoada, percebem? Talvez não, talvez não percebam. Mas sim, agora, finalmente, é que estou igual.

mh

*http://p3.publico.pt/actualidade/sociedade/20363/quando-se-muda-de-vida-aos-40

2 thoughts on ““Quando se muda de vida ao 40’s”

  1. Viagens da Helena diz:

    Quando comecei este blog as viagens eram um apontamento, importante, que não se sobrepunha à mudança do que eu sentia estar a acontecer comigo, os 40’s, e cada vez mais tenho a certeza que esta transformação é essencial na nossa vida … fico feliz pelo encontro de espirito e sentimentos 🙂

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