Hoje de tarde, no reboliço das muitas crianças que brincavam, felizes com o início do cálido setembro, sendo conhecidas ou recém chegadas, me recebem sempre com um abraço terno e beijinhos doces que retribuo no dobro, no triplo, amassando-os, como se fossem mesmo meus, recebi a visita inesperada, muito agradável, de antigas alunas queridas, que guardadas no meu coração foram meninas que me causaram muitas alegrias na mesma medida dos dissabores que enfrentaram. Cada uma com o seu caracter e feitio (difícil, que são os melhores!) atreveram-se sempre a ser diferentes, e por isso mesmo serem muito mais que o rebanho que tantas vezes são ensinadas a tentarem ser. Estão umas mulheres, diz-se! Umas tolas, também!
Intensas, espalhafatosas, barulhentas, regateiras, apaixonadas foram (são) das minhas preferidas … deram-me muito trabalho, que fazer! Até noites sem dormir, entravam na adolescência com a força avassaladora da certeza de saberem tudo e sabermos não saberem nada.
A M. tem um ninho familiar muito forte e coeso, daqueles que vivem, que riem, que gritam, que amam, e cedo foi acalmando a tempestade que fustigava todos, tornando-se numa bela rapariga, responsável e com sentido do outro. É uma figura maternal por excelência e, por isso, uma cuidadora. Para mim, um orgulho imenso! Com ela emociono-me e confio. Ela conhece-me bem e também me confiou sempre as suas questões. É, eu sei, uma amiga para a vida!
A A. não teve o calor dos braços do pai ou da mãe que a amparassem nos sonhos maus, que chamassem a fada dos dentes quando os incisivos dormiam sob a sua cabeça esperançosa, que falassem com a senhora professora ou lado a lado apagassem as velas dos 10 anos … A A. teve (e tem) muito mais que aquelas sombras que, por acaso da natureza, lhe deram filiação. Ela tem um anjo da guarda que a vela, noite após noite, pedindo ao senhor que a proteja, que lhe dê juízo e que lhe dê um bom emprego. A sua avó é a mãe e o pai que todas as crianças deste mundo mereciam ter. Mas como a vida foi matreira encheu-a de previdências e cautelas e não deseja mais que uma boa vida para a menina. Que é mulher!
Fez-se mulher cedo demais porque os caminhos escolhidos a marcaram de nódoas difíceis de sair. Uma reviravolta na sua compreensão sensorial e o despertar para um mundo de auto conhecimento e amor próprio levaram-na ao desafio de escolher para seu crescimento académico a mãe de todos os conhecimentos: a Filosofia!
Conversámos e explicou-me que não sabe, tem dúvidas, ouviu dizer que não dá emprego. Mas disse-me também que necessita de pensar, que necessita de encontrar respostas, profundas, às muitas questões que se coloca, que o mundo lhe coloca.
O que lhe disse? Pois, que seguisse em frente. Que se atrevesse a ser feliz. Que na sua diferença se ia sentir muitas vezes só. Na mais profunda solidão. Que procurar respostas é muitas vezes um caminho até à dor, ao sofrimento. Mas também à verdade. Que se entregasse e acreditasse que era capaz de fazer o que quisesse desde que fosse verdadeira.
E aqui entre nós, que ela não nos ouve, fiquei a transbordar de felicidade e orgulho porque a semente que plantei, reguei e cuidei está uma bela flor!
mh
A saber … a “Filosofia é uma palavra grega que significa “amor à sabedoria” e consiste no estudo de problemas fundamentais relacionados à existência, ao conhecimento, à verdade, aos valores morais e estéticos, à mente e à linguagem.”
E um “Filósofo é um indivíduo que busca o conhecimento de si mesmo, sem uma visão pragmática, movido pela curiosidade e sobre os fundamentos da realidade.”